Medicina personalizada e medicina de precisão, desafios da Reprodução Humana e autonomia foram os principais assuntos discutidos na manhã desta quarta-feira (4), em João Pessoa, no primeiro dia do III Encontro Luso-brasileiro de Bioética. O evento, organizado pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) em parceria com o Conselho Regional de Medicina da Paraíba (CRM-PB), iniciou nesta quarta e segue até a quinta (5), quando serão discutidos temas como terminalidade da vida e cuidados intensivos, medicina da era digital e medicina baseada em evidências.

“É uma grande satisfação receber aqui em João Pessoa um evento desta magnitude. Espero que nestes dois dias tenhamos muitos ensinamentos e discussões para caminharmos cada vez mais para uma Medicina com ética. Agradeço a presença de todos vocês que engradecem o evento e trazem informações importantes para o debate”, destacou o presidente do CRM-PB, Roberto Magliano de Morais.

Além do presidente do CRM-PB, participaram da abertura do Encontro o 1º vice-presidente do CFM, Donizetti Giamberardino Filho, o coordenador da Câmara Técnica de Bioética do CFM, José Hiran da Silva Gallo, o conselheiro federal do CFM pela Paraíba Adriano Sérgio Meira, o presidente da Associação Médica Brasileira Lincoln Ferreira, e o diretor do Programa Doutoral em Bioética da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (Portugal), Rui Nunes.

“Este evento é de grande importância por investir no capital humano. A bioética, como ciência e filosofia, é uma forma de construir um mundo melhor, com mais dignidade. Essa transmissão de conhecimento entre o CFM e a Universidade do Porto é de extrema importância”, disse Donizetti Filho. José Hiran Gallo destacou a presença do professor doutor Rui Nunes no Encontro. “O doutor Rui é uma das maiores sumidades da bioética no mundo. Estamos aqui com um grupo de experts para discutirmos e aperfeiçoarmos nossas rotinas e práticas médicas”, concluiu Hiran Gallo.

O conselheiro federal Adriano Meira também agradeceu a presença de todos e falou da importância em sediar o Encontro. “Este é um evento importante e ilustre, de suma relevância para a Medicina”, disse. Já o presidente da AMB destacou a necessidade de se discutir assuntos polêmicos. “Debateremos aqui, durante dois dias, assuntos palpitantes. Serão discutidas questões sobre como nos vemos como espécie e seres sociais, em um mundo complexo e tecnológico”, afirmou Lincoln Ferreira.
No primeiro dia do evento foi realizada uma conferência e duas mesas redondas, além do lançamento do livro “Memórias da Câmara Técnica de Bioética”, com uma coletânea das discussões sobre o tema.

Da Medicina personalizada à Medicina de precisão – A primeira conferência do Encontro foi proferida pelo professor Dr Rui Nunes. Ele agradeceu o apoio do CFM e disse que era um grande prazer estar no Brasil mais uma vez para discutir este tema. “Começamos a pensar neste evento, que já está em sua terceira edição, com o projeto de Doutorado em Bioética da Universidade do Porto, que já formou 10 turmas, totalizando cerca de 300 doutores”, disse o professor.

Rui Nunes iniciou a conferência falando das alterações que a Bioética e a Medicina sofreram após a análise do genoma humano, no início dos anos 90. “Ao analisar o genoma, tivemos consequências importantes. Além dos benefícios tecnológicos, tivemos problemas éticos”, afirmou. Ele explicou que, do ponto de vista genético, somos todos iguais, sem distinção de raças ou etnias. No entanto, há populações genéticas específicas, que resultam em uma medicina personalizada e de precisão.

“Em um país continental, como o Brasil, por exemplo, é preciso ter cuidado para não haver injustiça no acesso às novas tecnologias e fármacos. Não podemos permitir a personalização da medicina apenas para um grupo, em detrimento de outros”, disse. Ele acrescentou que a tecnologia, obviamente, é bem vinda, mas é preciso estar atento a algumas questões. “A relação médico/paciente é uma questão muito discutida atualmente, principalmente, pela falta de tempo. Não podemos esquecer-nos da importância da consulta ‘olhos nos olhos’ e da relação de confiança com o paciente”, acrescentou.

Mesas redondas e debates – Após a conferência do professor Rui, foram realizadas duas mesas redondas e debates sobre “Desafios atuais da Medicina da Reprodução Humana” e “Autonomia: dilemas contemporâneos”. A primeira discussão contou com o moderador Antônio Henriques de França Neto, vice-presidente do CRM-PB, com o debatedor Roberto Magliano de Morais, presidente do CRM-PB, além dos expositores Lívia Maria Zago (Universidade de São Paulo), Hitomim Nakagawa (Sociedade Brasileira de Reprodução Assistida) e Humberto Belmino Chaves (Universidade Federal de Alagoas).

Eles falaram sobre a importância de diretrizes bem definidas para a reprodução assistida, harmonia entre técnica e ética, como preservar a igualdade e sigilo, doação de gametas e embriões, infertilidade, falta de legislação no país sobre este tema, além de outras questões. Após a apresentação dos expositores, Roberto Magliano iniciou a discussão questionando o status moral do embrião. “Os embriões podem e devem ser tratados como seres humanos? Ou melhor, o ser humano nascido tem mais direitos que os intrauterinos? O embrião é somente um conjunto de células?”, provocou os presentes.

“Temos grande respeito pelo embrião. Mas ele é um potencial de vida, não um organismo autônomo”, disse Hitomi Nakagawa. “O descarte de embriões é uma decisão dificílima. É preciso ter cautela”, completou Lívia Zago.

A segunda mesa redonda discutiu autonomia e dilemas contemporâneos, como a vulnerabilidade social, imigrantes e pessoas com deficiência. A discussão teve como moderador o segundo vice-presidente do CRM-PB João Modesto Filho, como debatedor o membro da Câmara Técnica de Bioética do CFM Gérson Zafalon Martins e como expositores o filósofo e professor José Dimas Monteiro, o educador físico e professor Jacob Cachinga e a professora da Universidade Federal de Campina Grande Adriana Melo.

José Dimas fez alguns questionamentos e analisou filosoficamente determinados temas. “Acredito que a autonomia não existe, só a moderada. Como pensar em autonomia para quem tem limitações, por exemplo?”, indagou. Já Adriana Melo falou do seu trabalho, reconhecido internacionalmente, que associou o zyka vírus às crianças com microcefalia, no ano de 2015. “Infelizmente, essas crianças ainda são abandonadas pelo poder público. As pessoas com deficiência precisam ser inseridas na família, na sociedade, na educação, na profissão e, principalmente, na saúde”, disse.

Para falar sobre os imigrantes, o educador físico e professor angolano, Jacob Cachinga, contou sua história de vida. Vindo para o Brasil aos 11 anos, com deficiência visual e fugindo da guerra civil de seu país, foi morar em Curitiba (PR), onde foi alfabetizado e estudou até o curso superior. “O imigrante é realmente vulnerável social, moral e existencialmente. Não saímos da nossa terra porque queríamos. Saímos para sobreviver”, disse. Ele acrescentou que começou a estudar sobre a bioética da proteção, necessária para proteger os mais vulneráveis.

Programação do último dia – Na quinta (5), o evento tem início às 9h, com a mesa redonda sobre Terminalidade da Vida e Cuidados Paliativos, que terá como expositores o professor doutor da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (Portugal), Paulo Maia, o mestre em Bioética pela PUC do Paraná, Eric Grieger Banholzer, e a presidente da Associação Médica da Paraíba, Débora Cavalcanti.

A segunda mesa redonda ratará da Medicina na era digital. Os expositores serão o professor da Universidade Federal de Alagoas Jorge Arthur Coelho, o professor da Universidade Sul de Santa Catarina, Roberto Luiz d’Ávila, e o membro da Câmara Técnica de Informática da Saúde do CFM, Aldemir Humberto Soares.
A conferência de encerramento será sobre Medicina baseada em evidências com a conferencista Clarice Petramale, assessora especial do CFM para questões de novas tecnologias. Ao final será lida a Carta de João Pessoa.

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