A infectologista Joana D’Arc Silveira Frade acredita que a pior fase da pandemia da Covid-19 já passou, com os medos e as incertezas do início da doença. No entanto, faz um alerta que o vírus ainda circula e que é fundamental manter medidas de proteção, como o uso de máscaras e evitar aglomerações. “Provavelmente, continuaremos convivendo com o novo coronavírus por muito tempo, até que haja uma vacina efetiva, realmente eficaz e disponível para toda a população”, disse a médica formada pela Universidade Federal da Paraíba, em 1987, com residências em Clínica Médica e Infectologia.

Atualmente, ela é diretora técnica do Complexo de Doenças Infecto Contagiosas Clementino Fraga (hospital referência no tratamento da Covid-19 na Paraíba), em João Pessoa, atende em consultório particular e presta atendimento domiciliar. Na entrevista a seguir, ela fala sobre os desafios que enfrentou na linha de frente contra a Covid-19, de sua rotina de trabalho atual, do “novo normal” e de como as fake news sobre o novo coronavírus atrapalham a conduta médica.

Como foi para a sra trabalhar na linha de frente logo no início da pandemia? Quais foram os principais desafios?
O maior desafio em trabalhar na linha de frente no início da pandemia foram os momentos de incertezas, quando a gente pouco conhecia sobre o vírus e sobre a forma como ele poderia evoluir para os pacientes. A própria forma como tratar foi o grande desafio, além do receio emocional, do medo do desconhecido, como aconteceu com todas as pessoas. Como estávamos diante de uma situação inusitada, foi bem difícil no primeiro momento. Depois, a medida que a gente foi se acostumando e tendo mais conhecimento sobre a doença, sobre o comportamento do vírus e as estratégias de tratamento, a situação ficou menos crítica.


Como tem sido, atualmente, a sua rotina de trabalho?

Como estou em um cargo de direção de hospital, minha rotina de trabalho envolve atividades burocráticas, além de atender em dois dias da semana em consultório e ainda faço visitas domiciliares. Então é uma rotina de trabalho bem intensa, que começa às 7h da manhã e não tem hora para acabar. Nos últimos dias tem sido mais leve, já que tem diminuído a demanda por visitas domiciliares, pois menos pessoas estão adoecendo e necessitando desse atendimento presencial. Efetivamente, há ainda um grande número de consultas feitas no sistema de telemedicina, porque as pessoas ainda têm um certo receio de serem atendidas presencialmente em consultório, porque não deixa de existir uma certa aglomeração. Considerando que algumas doenças ficaram “negligenciadas”, ou seja, as pessoas estavam evitando em ir para seus médicos habituais, para seus controles de rotina. Mas agora estão sentindo a necessidade de voltar e isso demanda nas clínicas e hospitais uma procura maior de atendimento.

Como a sra avalia o “novo normal”? Acredita que as pessoas estão conscientes sobre os cuidados a serem tomados para a não disseminação do novo coronavírus?
Infelizmente, as pessoas ainda não estão muito conscientes da necessidade de manter os cuidados de distanciamento social. No momento em que as pessoas começaram a perceber que a letalidade da doença tem diminuído, começaram a ter uma despreocupação em estarem juntas, o que é de fato bastante preocupante, pois a gente pode se deparar com uma nova onda de contaminação, um novo aumento do número de casos. Todos nós precisamos entender, precisamos ter bom senso, que a doença não desapareceu, que ela vai permanecer por muito tempo. Provavelmente, continuaremos convivendo com o novo coronavirus por muito tempo, até que haja uma vacina efetiva, realmente eficaz e disponível para toda a população. Teremos que convier com este vírus, como acontece com outros vírus respiratórios que circulam, para os quais a gente tem que ter cuidado, mas são vírus com menor gravidade, em que a letalidade é muito mais baixa que o SARS Cov 2. 

As fakenews e a desinformação atrapalham o seu trabalho, a condução do tratamento dos seus pacientes?
As fakenews atrapalham demais o nosso trabalho. Primeiro porque as pessoas já têm adoecimento mental, causados pela ansiedade, pelo medo de uma doença desconhecida. Aí soma-se a isso essas fakenews, tanto em relação a característica da doença (que não são verdadeiras), quanto em relação ao uso de substâncias, medicamentos, chás e estratégias de tratamentos que não são verdadeiros que, inclusive podem até colocar em risco a vida das pessoas. Então isso realmente atrapalha bastante, porque na consulta a gente tem que desconstruir esses conceitos. E isso não é fácil.

Apesar do relaxamento do isolamento social e a reabertura de vários setores da economia, a taxa de ocupação dos hospitais com pacientes com Covid-19 tem diminuído. Como a sra avalia isso?
Com relação à diminuição da ocupação dos leitos, há duas situações que justificam essa redução das internações. Primeiro, a exposição das pessoas diminui, ao meu ver, ao se usar máscaras. As pessoas estão recebendo uma menor carga viral e isso pode favorecer formas menos graves da doença e influenciar no número menor de internações. Por outro lado, com a flexibilização, se as pessoas não estiverem conscientes, o que a gente pode estar vendo hoje é um hiato e esse número de internações voltar a aumentar, à medida que mais pessoas forem sendo expostas. De toda forma, o que a gente observa também é que algumas pessoas estão um pouco mais conscientes, principalmente os portadores de doenças crônicas. Em função da pandemia, eles ficaram mais conscientes da necessidade de cuidar melhor das suas doenças, principalmente, o diabetes. Pessoas que eram negligentes com o diabetes estão mais preocupadas em manter sob controle porque entendem que a diabetes descompensada, na eventualidade de se infectar pelo novo coronavírus, vai favorecer uma forma mais grave da doença.

A sra acredita que a pior fase da pandemia, na Paraíba, já passou?
Eu acredito que a pior fase da pandemia já passou, com o número absurdo de casos do início. Há agora também um esgotamento de pessoas suscetíveis. Então, eu acredito que sim e já houve uma mudança de comportamento que de fato vai impactar menos.

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