No ano de 2015, a médica ginecologista e obstetra de Campina Grande, Adriana Melo ficou conhecida nacional e internacionalmente por ter sido pioneira em identificar a relação do zika vírus com a microcefalia. Seis anos após o surto no país, ela continua ajudando famílias com o trabalho realizado no Instituto de Pesquisa Professor Joaquim Amorim Neto (Ipesq), em Campina Grande, atendendo pacientes com microcefalia, realizando exames e programas intensivos de fisioterapia.

Mas Adriana Melo já era reconhecida por seus colegas e pacientes na Paraíba há anos, como médica do Instituto de Saúde Elpídio de Almeida (Isea), como professora da Universidade Federal de Campina Grande, pesquisadora da Unifacisa, médica da clínica Embrion, além de presidir o Ipesq. Além da dedicação aos seus pacientes, ela tem um vasto currículo: é formada em Medicina pela UFPB, com Residência em Ginecologia e Obstetrícia pelo Hospital Agamenon Magalhães (Recife/PB), Especialização em Medicina Fetal pela Maternidade Escola Laranjeiras – UFRJ, Mestrado em Saúde Coletiva pela UEPB, Doutorado em Tocoginecologia pela Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP (2012), Doutorado em Saúde Materno Infantil pelo Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira – IMIP e Pós-Doutorado em Saúde Materno Infantil pelo Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira – IMIP.

No início da pandemia de covid-19, ano passado, ela foi uma das médicas a primeiro se manifestar contra a não adesão ao isolamento social e às recomendações comprovadas cientificamente. Na semana passada, o Observatório Obstétrico Brasileiro Covid-19 divulgou que mais que dobrou o número de mortes de grávidas pela doença em 2021, em relação à média de 2020 e Adriana voltou a defender a necessidade do isolamento social das gestantes. “Estamos em alerta desde o início da pandemia. Em 2020, 75% das mortes maternas relacionadas à Covid ocorreu no Brasil. Uma verdadeira tragédia”, afirma a médica.

Na entrevista a seguir, ela fala sobre os riscos das gestantes e puérperas que se expõem ao vírus, defende a vacinação contra a covid-19 para as grávidas, ressalta a necessidade de uma nova maternidade pública em Campina Grande, já que recebe gestantes de grande parte do estado, e dá um recado otimista aos profissionais de saúde da linha de frente que estão exaustos: “Vai passar”.

O número de mortes de grávidas e puérperas por covid-19 mais que dobrou em 2021 em relação à média de 2020, conforme dados do Observatório Obstétrico Brasileiro Covid-19. Como a sra avalia esta situação?

Nós, pesquisadores e obstetras, ficamos em alerta desde o início da pandemia. Sabemos que devido às adaptações necessárias para o desenvolvimento do feto, as gestantes têm maior predisposição às infecções virais, como já visto durante a H1N1. Estudo realizado nos Estados Unidos mostrou que as gestantes apresentaram risco maior de internação em Unidade de Terapia Intensiva e maior necessidade de ventilação invasiva. No Brasil, durante a primeira onda, foi observado um aumento alarmante dos óbitos durante a gravidez e o puerpério imediato. Trabalhos publicados pelo grupo brasileiro Covid and Pregnancy, formado por renomados pesquisadores brasileiros, vêm alertando sobre a grave situação da mortalidade materna pela Covid desde agosto de 2020. No ano de 2020, 75% das mortes maternas relacionadas à Covid ocorreu no Brasil, ou seja, a cada 10 mortes maternas pela Covid-19, quase oito mulheres eram brasileiras. Uma verdadeira tragédia.


O que pode ser feito para reduzir a mortalidade das gestantes por covid-19?

O primeiro passo é a conscientização sobre os riscos e como reduzi-los. Sabemos que nesse momento não podemos manter os mesmos hábitos de antes da pandemia, principalmente pessoas com risco aumentado para desenvolver as formas mais graves da doença, como gestantes, idosos, pessoas com comorbidades. Portanto, é importante que a grávida fique em casa o maior tempo possível, só saindo para as consultas e exames. Ao sair de casa o uso de máscara e a higienização constante das mãos são mandatórios. Devemos ressaltar os riscos de tirar a máscara em ambientes fechados, mesmo para tomar água. Além disso, ficar em casa significa também não receber visitas. Na hora do parto, o acompanhante deve ser o mesmo que já convive com a grávida na mesma residência. Visitas no hospital e na residência devem ser evitadas principalmente nos primeiros 15 dias após o parto. Entretanto, a intervenção mais eficaz seria incluir as gestantes como prioridade no programa de vacinação.


Qual a opinião da sra sobre a vacinação contra a covid-19 para gestantes? Deve ser feita?

Eu sou a favor. Entidades como o Colégio Americano de Obstetrícia e Ginecologia (ACOG), o Instituto Nacional de Saúde dos Estados Unidos, O Royal College e a Federação Internacional de Ginecologia e de Obstetrícia recomendam a vacinação de todas as grávidas independentemente da idade gestacional. Devemos ressaltar que as vacinas contra a Covid-19 usadas no Brasil usam o vírus morto ou vetores virais não replicantes, o que confere segurança, uma vez que outras vacinas que utilizam essa mesma plataforma viral já são usadas durante a gravidez. Dados de mais de 20 mil gestantes que receberam vacina de RNA mensageiro não mostraram aumento do risco de complicações como aborto, malformações fetais e parto prematuro. Atualmente o Ministério da Saúde do Brasil recomenda:

I – Vacinar contra Covid-19 todas as gestantes com comorbidades pré-existentes que estão descritas no Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra Covid-19 (Diabetes, hipertensão arterial crônica, Obesidade IMC ≥30, doença cardiovascular, asma brônquica, imunossuprimidas, transplantadas, doenças renais crônicas e doenças autoimunes.

II – Para as gestantes sem comorbidades, a nota técnica do MS recomenda que a vacina contra Covid-19 pode ser oferecida, após avaliação dos riscos e benefício.


O isolamento social por causa da pandemia afetou o atendimento pré-natal das gestantes? Muitas pacientes estão receosas em realizar todos os exames e consultas?

Com certeza a assistência pré-natal foi afetada, principalmente na primeira onda em 2020, quando muitas unidades de saúde fecharam por falta de condições básicas de trabalho para os profissionais de saúde. Não tínhamos máscaras. No início, as gestantes também tiveram receio, principalmente devido ao recente episódio do Zika vírus, quando os fetos foram drasticamente atingidos. Com o maior conhecimento da doença e das formas de prevenção, as gestantes estão sentindo-se mais tranquilas.


Estudo realizado pelo CRM-PB em 2018 mostrou que 60% dos partos do Estado são feitos em João Pessoa e Campina Grande e que a maioria dos municípios não possui maternidade. Na semana passada, o Isea, mais uma vez, anunciou sua superlotação de leitos e a falta de profissionais. Diante disso, como a sra avalia o atendimento à gestante na Paraíba?

Infelizmente Campina Grande dispõe hoje apenas de uma maternidade pública. Como o ISEA possui setor de alto risco, UTI pediátrica e materna, recebe gestantes de grande parte do estado, sobrecarregando o serviço. A superlotação aumenta riscos de infecções e de outras complicações, sobrecarregando psicologicamente o profissional de saúde que se sente incapaz. Além da superlotação nas maternidades, temos que discutir a qualidade da assistência pré-natal, uma vez que uma boa assistência pré-natal pode reduzir desfechos gestacionais desfavoráveis. Mas, independentemente de qualquer melhora na qualidade, a região que engloba Campina Grande, necessita, de maneira urgente de uma nova maternidade pública.


Os profissionais de saúde já estão exaustos em mais de ano de trabalho árduo na pandemia. Qual mensagem a sra pode dar a eles?

Vai passar…

Spotify Flickr Facebook Youtube Instagram
Aviso de Privacidade
Nós usamos cookies para melhorar sua experiência de navegação no portal. Ao utilizar o Portal Médico, você concorda com a política de monitoramento de cookies. Para ter mais informações sobre como isso é feito, acesse Política de cookies. Se você concorda, clique em ACEITO.