No dia 11 de setembro, as entidades médicas do Nordeste (Associações Médicas, Conselhos Regionais e Sindicatos) estiveram reunidas em Fortaleza (CE) com os secretários municipais e estaduais de saúde da região para debater os problemas enfrentados pelo sistema público de saúde, principalmente no que diz respeito à defasagem da tabela de remuneração do Sistema Único de Saúde (SUS) e ao financiamento destinado ao setor. De acordo com a Carta do Nordeste, documento redigido após o encontro, entregue ao ministro da Saúde José Gomes Temporão, médicos e gestores pedem que 60% dos R$ 2 bilhões descontingenciados pelo Ministério da Fazenda no início deste mês sejam destinados ao reajuste dos procedimentos, principalmente os de média complexidade, e o restante seja utilizado para o aumento dos limites financeiros dos Estados e municípios, de forma a diminuir as desigualdades existentes entre as regiões. A Carta ainda propõe, a fim de tentar sanar a crise, que seja aplicado por todo o País o valor mínimo de R$ 130,00 per capita, a utilização da CBHPM como parâmetro para reestruturar a tabela do SUS, a construção e implementação do Plano de Carreira, Cargos e Salários (PCCS) em nível federal e a volta do Código 7, mecanismo que remunera diretamente o profissional. Por fim, pedem a aprovação e a regulamentação da EC 29. O presidente da Associação Médica Brasileira (AMB), José Luiz Gomes do Amaral, destacou dois pontos fundamentais que culminaram na crise pela qual passa a saúde do Nordeste e o início das reivindicações. Primeiro, os médicos nordestinos trabalham quase que exclusivamente para o SUS, uma vez que apenas 9% da população é conveniada a algum plano. Segundo, o Nordeste recebe poucos investimentos para o setor. Outro ponto frisado por Amaral refere-se à aproximação entre gestores e médicos. Segundo ele, ambos devem trabalhar juntos, uma vez que têm o mesmo objetivo. “Ao longo do tempo, houve um afastamento entre os dois, o que precipita as crises e dificulta uma solução”, disse. O presidente da AMB ressaltou ainda que de 2000 para cá o orçamento da Saúde triplicou, mas não houve reflexos no SUS. “A remuneração dos médicos continua a mesma, continuamos sem o PCCS e o Código 7, que era a única forma de remuneração direta, foi extinto. Isso faz com que os médicos se sintam alijados da proposta de assistência à saúde no Brasil.” Repercussões O presidente da Associação Baiana de Medicina, José Carlos Raimundo Brito, considerou a reunião positiva. “Temos de cultivar a prática destes encontros, pois os debates foram mais convergentes que divergentes”, disse. Ele considera o conteúdo da Carta do Nordeste como sinalizador dos caminhos a serem seguidos a partir de agora. Roberto Queiroz Gurgel, presidente da Sociedade Médica de Sergipe, comentou sobre a necessidade de haver um canal de negociação permanente com os gestores e que os R$ 2 bilhões devem ser alocados estritamente para a atualização da tabela do SUS. “A reunião foi proveitosa porque pudemos desabafar. Mostramos aos gestores que os médicos do SUS estão cansados de fazer uma operação de vesícula por apenas 30 reais. Mostramos também que os reajustes deverão ser constantes para repor os dez anos de defasagem. Se não for assim, daqui a quatro ou cinco meses a crise explodirá novamente”. “Em vista da situação atual, R$ 2 bilhões são uma migalha para a Saúde. Por outro lado, mostra que o governo está preocupado. O que eles precisam se dar conta é que Saúde não é gasto, é investimento”, disse o presidente do Sindicato dos Médicos de Pernambuco e secretário-geral da Associação Médica de Pernambuco, Mário Fernando Lins. Em Alagoas, a classe médica fiscalizará o destino dos R$ 2 bilhões liberados pelo Ministério da Fazenda à Saúde, para que não hajam desvios. Segundo o presidente da Sociedade de Medicina de Alagoas, Cléber Costa de Oliveira, a recente paralisação dos médicos do Estado indicou três fatores aos gestores: a insuficiência de recursos; os médicos precisam ser mais bem remunerados e a urgente criação do PCCS nacional. “Não temos expectativa de que essa crise na saúde vá se resolver com as últimas medidas adotadas, dada à gravidade, mas pelo menos o ministro Temporão tem tido coragem de mostrar os problemas”, disse Oliveira. A presidente da Associação Médica Cearense, Marjorie Mota, também afirma que os médicos do Estado ficarão atentos ao destino da verba e vão se mobilizar junto aos parlamentares para que a EC 29 seja aprovada e regulamentada. “O momento agora exige que seja revisto o repasse e o salário dos médicos. Nós defendemos o SUS, mas os gestores da saúde precisam valorizá-lo também.” Para o presidente do Conselho Regional de Medicina (CRM) de Alagoas, Emmanuel Fortes Cavalcanti, a reunião consolidou a necessidade de mais verbas, a instituição de PCCS e a utilização do método da CBHPM na correção da tabela do SUS. “A luta travada pelos médicos foi responsável pela mudança de atitude do governo federal e pela liberação dos R$ 2 bilhões”, disse Cavalcanti. O presidente do CRM-PE, Carlos Vital Tavares Lima, destacou a participação ativa do presidente da AMB nas negociações e defende que a aproximação dos médicos com gestores tome caráter rotineiro. Para ele, “a liberação dos R$ 2 bilhões demonstra a intenção do governo em conter a crise, mas mesmo assim ainda são insuficientes. Em todo caso, a reunião foi positiva e abre canais de comunicação entre gestores e classe médica”. Na opinião do presidente da Associação Médica do Rio Grande do Norte, Geraldo Ferreira Filho, o diálogo entre médicos e gestores foi positivo. “Normalmente, os secretários abafavam os problemas, dizendo que a situação estava sob controle, e contestavam as reivindicações dos médicos. Mas com essas mobilizações por todos os Estados, eles viram que a coisa é séria e agora começam a se aproximar da tese dos médicos”. Sobre os R$ 2 bilhões descontingenciados, Ferreira Filho diz: “é um avanço, mas precisaria de no mínimo 5 bilhões”. Leia abaixo a íntegra da “Carta do Nordeste”: CARTA DO NORDESTE Fortaleza, 11 de setembro de 2007. Excelentíssimo Senhor Ministro da Saúde José Gomes Temporão Os secretários estaduais de saúde do Nordeste, em conjunto com as entidades médicas reunidos em Fortaleza – Ceará, discutiram a situação atual da saúde pública na Região, sendo destacados os seguintes pontos: – O Nordeste tem os piores indicadores sociais; os estados e municípios têm menor capacidade de gerar recursos próprios; recebem menores valores per capita dos recursos federais; e grande contingente da sua população depende exclusivamente do SUS; – Os valores de referência dos procedimentos ambulatoriais e hospitalares, historicamente vêm acumulando defasagem em relação ao custo real; – A gestão do trabalho em saúde é inadequada para a garantia de uma prestação de serviços efetiva, acarretando grandes perdas para a população e profissionais de saúde, em especial os da categoria médica; – Os critérios de distribuição dos recursos federais para a média e alta complexidades, apenas baseada na produção de serviços, não contemplam as variáveis: envelhecimento da população, epidemia da violência e a incorporação tecnológica; – A crise na assistência médica de urgência e emergência enfrentadas por alguns estados. Na busca de soluções dos pontos acima destacados, sugerimos: a) Destinar 60% dos recursos federais descontingenciados (2 bilhões de reais) para o reajuste dos procedimentos, especialmente os de média complexidade e 40% para aumento dos limites financeiros dos estados e municípios ; b) Os recursos relativos ao aumento dos limites financeiros dos estados e municípios sejam calculados tendo como base critérios que reduzam as desigualdades existentes entre as regiões; c) Diminuir as desigualdades regionais instituindo um per capita nacional no valor mínimo de R$ 130,00 (cento e trinta reais); d) Utilizar como parâmetro imediato para a reestruturação e atualização da Tabela SUS (SIA e SIH) a CBHPM; e) Reformular a Política Nacional de Atenção à Urgência garantindo a transferência de recursos financeiros federais para custeio e investimento de serviços de atendimento ambulatorial de urgência fixo (pronto atendimento – 24 horas); f) Separar para efeito de análise os recursos aplicados na média complexidade, dos aplicados na alta complexidade; g) Construir e implementar na esfera federal e estimular estados e municípios, com urgência, à elaboração e implantação de Plano de Carreira, Cargos e Salários, com especificidade para a categoria médica, considerando piso nacional; h) Retornar o pagamento dos honorários médicos diretamente na conta corrente do profissional que atende na rede complementar; i) Fortalecer o Pacto pela Saúde, garantindo maior transferência de recursos da média complexidade para a gestão estadual e municipal; j) Integrar os saberes das entidades médicas como apoio para produção dos Protocolos e Diretrizes e nas negociações com o Ministério Público. Por fim, reconhecemos os esforços de V. Exa. para o descontingenciamento dos dois bilhões de reais para o SUS. O aporte desses recursos é insuficiente para suprir as imensas necessidades da população, no entanto ressaltamos o grande empenho na construção do SUS e nos colocamos em apoio na luta pela regulamentação da EC 29. Secretários de Saúde do Nordeste e Entidades Médicas do Nordeste

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