Dra. Nara Crispim
MÉDICA CRM-PB: 6329
Endocrinologia e Metabologia RQE: 5129
Nutrologia RQE: 5594
Presidente da SBEM-PB
Durante minha participação no Congresso Europeu de Obesidade (ECO 2025), realizado entre os dias 11 e 14 de maio, em Málaga, na Espanha, acompanhei de perto os avanços mais recentes sobre fisiopatologia, prevenção, diagnóstico, complicações e tratamento da obesidade. Em meio a tantas inovações terapêuticas, optei por destacar um tema que considero fundamental para o enfrentamento da obesidade em larga escala: o papel das políticas públicas na prevenção da obesidade e de suas consequências cardiovasculares.
O estudo que escolhi analisou, por meio de modelagem por microsimulação, os impactos projetados de duas intervenções regulatórias em dois países europeus, Bélgica e Alemanha, ao longo de 20 anos (2022–2041):
- A rotulagem calórica obrigatória em restaurantes e estabelecimentos de alimentação fora do lar;
- A tributação de bebidas adoçadas com açúcar (SSB), com alíquotas progressivas de até 30%.
Com base em dados populacionais reais e efeitos extraídos de metanálises, o modelo apontou reduções expressivas na prevalência de obesidade e na mortalidade por doenças cardiovasculares.
Na Bélgica, a rotulagem calórica universal mostrou potencial para reduzir a prevalência de obesidade em até 3,6 pontos percentuais e evitar cerca de 1.600 mortes cardiovasculares. Já a tributação das bebidas açucaradas, com alíquota de 30%, poderia evitar aproximadamente 2.500 mortes no mesmo período.
Na Alemanha, os efeitos estimados foram ainda mais significativos: a rotulagem calórica ampliada poderia levar a uma redução de até 4,3 pontos percentuais na prevalência de obesidade e prevenir cerca de 5.300 mortes cardiovasculares, enquanto a tributação de bebidas açucaradas teria capacidade de salvar aproximadamente 16.000 vidas.
O estudo também revelou que a rotulagem calórica foi mais efetiva entre indivíduos com maior escolaridade, enquanto a tributação de bebidas açucaradas teve maior impacto entre pessoas com menor nível educacional, evidência de que essas estratégias contribuem para a redução das desigualdades em saúde. Quando aplicadas de forma conjunta, as políticas demonstraram efeitos complementares e sinérgicos.
Acredito que estudos como esse reforçam um ponto essencial: para além da inovação farmacológica, a saúde populacional depende de ações preventivas integradas, acessíveis e sustentadas por políticas públicas eficazes.
Defendo que essa abordagem deve servir como referência concreta para o contexto brasileiro, onde enfrentamos uma crescente prevalência de obesidade e suas complicações. Medidas como uma rotulagem nutricional mais clara e a taxação de produtos ultraprocessados são viáveis, baseadas em evidências robustas e com potencial transformador.
Cuidar da saúde coletiva é investir, desde agora, em um futuro mais saudável e sustentável para todos.