Por Dr. Ricardo J. M. Lucena
MÉDICO CRM-PB: 4080
Psiquiatra RQE 3440
Em primeiro lugar, é preciso ressaltar que a tradução do anglicismo “Mindfulness” corresponde à expressão “Atenção Plena” em português. Por essa razão, o uso dessa expressão em nosso idioma é recomendado ao leitor, sendo a mesma adotada ao longo do presente texto. O conceito de Atenção Plena, conforme concebido por Jon KabatZinn, é a “consciência que emerge, quando prestamos atenção, intencionalmente, ao momento presente, sem julgamento”, e acompanhamos o desdobramento de nossas experiências momento a momento.
A ideia central nesse conceito é “parar e fazer-se presente”. Por um momento, focamos a atenção no presente e observamos as sensações em nosso corpo, o conteúdo de nossa mente e o que está acontecendo no mundo à nossa volta. A capacidade de concentrarmos nossa atenção no momento presente requer prática contínua, pois naturalmente nossa atenção flutua entre o presente, o passado e o futuro. A prática regular da Atenção Plena nos permite tomar consciência das interações entre nosso corpo, nossa mente e o nosso entorno.
No final dos anos 70, inspirado nas práticas meditativas do Zen Budismo (meditação Zazen) e na Hatha Yoga, Jon Kabat-Zinn, professor emérito da Faculdade de Medicina da Universidade de Massachusetts, nos EUA, desenvolveu o primeiro programa de intervenção clínica, baseado na prática da Atenção Plena: Redução do Estresse Baseada na Atenção Plena (MBSR – Mindfulness Based Stress Reduction). O programa foi aplicado incialmente a pacientes acometidos de dor crônica e de transtornos ansiosos que não respondiam bem aos tratamentos convencionais.
Nesse programa, são ensinadas as práticas formais de Atenção Plena (a saber, meditação com foco na respiração, escaneamento corporal, caminhada com atenção e 22 posições de Hatha Yoga), bem como as práticas informais e as atitudes que facilitam a prática diária da Atenção Plena. O programa é conduzido por um profissional especializado nessa intervenção, em sessões de grupo (uma sessão semanal de 2.5-3h), durante oito semanas.
Apesar de sua origem em práticas meditativas milenares, o programa não inclui práticas religiosas e foi submetido à avaliação científica rigorosa, ao longo de mais de quatro décadas, incluindo ensaios clínicos randomizados e meta-análises. Após apenas oito semanas de prática da Atenção Plena, durante o programa MBSR, em estudos de neuroimagem, já podem ser observadas modificações em áreas cerebrais específicas, tais como a amígdala – menos reativa na resposta ao estresse – e maior ativação do córtex pré-frontal, resultando em melhor desempenho das funções executivas (por ex., planejamento, tomada de decisões e inibição do comportamento), além de melhorar a conectividade entre essas estruturas (amigdala e córtex pré-frontal ventromedial), contribuindo para melhor regulação emocional do indivíduo.
Outros benefícios do programa são respaldados também em evidência científica, tais como: melhora no manejo do estresse laboral (Síndrome de Burnout), dos sintomas ansiosos e depressivos, da dor crônica e melhora na capacidade de concentração da atenção.
O programa MBSR serviu de base para a criação de outras intervenções clínicas que incorporaram a prática da Atenção Plena, trazendo inúmeros benefícios para a saúde mental de pessoas acometidas de transtornos mentais e da população em geral. Ressalta-se, dentre essas intervenções clínicas, a Terapia Cognitiva baseada na Atenção Plena (MBCT – Mindfulness Based Cognitive Therapy) que se equipara em eficácia (e efetividade) aos antidepressivos no tratamento de manutenção de quadros depressivos, prevenindo a recaída e recorrência dos sintomas depressivos.
Em conclusão, os benefícios da prática da Atenção Plena são confirmados pela pesquisa científica, pelas pessoas que praticam a Atenção Plena regularmente, bem como pela sabedoria popular: “O passado já se foi. O futuro é um mistério. O hoje é uma dádiva que chamamos de presente – o momento atual em que temos a oportunidade de construir uma vida melhor”.